Psicodélicos | Futuro dos negócios e delírios da Sociedade Pós Moderna

Psicodélicos é um assunto que tem dominado o mercado desde 2022. No SXSW de 2023 isso ficou ainda mais evidente através de um debate feito por Liana Sananda Gillooly – que comanda a Strategic Initiatives for the Multidisciplinary Association for Psychedelic Studies – e Anna Martirosyan, que lidera a área de Strategy Business da Journey Collab. Durante o debate, foi apresentado um painel repleto de informações sobre os benefícios dos psicodélicos pra uma economia alternativa. 

O que é a economia alternativa?

Basicamente, a economia que é chamada de “alternativa” é uma forma que o capitalismo encontrou, entre seus milhões de desdobramentos, de usurpar uma pauta importante para o Movimento Slow e para os negócios que realmente estão visando o bem estar comum de uma sociedade: o PROPÓSITO. Segundo estudiosos do tema, a economia alternativa propõe pensar em uma economia que alinhe lucro e propósito, priorizando os stakeholders e não apenas acionistas. 

Porém, o que veremos adiante, será, na verdade, somente uma tentativa de lucrar mais, sem pensar realmente nos malefícios que isso pode causar para uma sociedade se não tivermos seriedade e comprometimento real dessa abordagem. Mas, antes, vamos falar dos benefícios de se pensar em psicodélicos e como pode ajudar nos avanços da medicina. 

 

Por que os psicodélicos estão sendo estudados e quais são seus benefícios?

Um dos temas que mais tem ganhado força desde a pandemia de 2020 é a valorização do bem estar e nossa saúde mental. Durante o período de quarentena, foi colocado a prova de que precisamos de mais qualidade de vida. Pois, a nossa vida tem se tornado muito corrida, hiper produtiva e sem consciência. A melhora da qualidade do ar e dos rios, durante o período de isolamento social, foram a prova de que nós, seres humanos, estamos prejudicando também o meio ambiente. Além de nos prejudicarmos mentalmente, com tanta cobrança, apenas pensando no lucro e na produtividade desenfreada. E foi justamente também por esse tema que o Movimento Slow tem ganhado cada vez mais força nos negócios e muitas empresas já estão começando a aderir essa filosofia em sua forma de produção. Mas, para o capitalismo, nada é em vão. Todo tema que é pautado em um benefício para sociedade é, de alguma forma, transformado em lucro. Esse é o neoliberalismo que atravessa a pós modernidade. 

As pessoas estão cada vez mais sofrendo de transtornos mentais por conta das más condições de trabalho, desigualdade e ansiedade. As redes sociais, e o excesso de informações de forma desenfreada, aceleraram esse processo. Em uma sociedade movida à lucro individual e consumo é de se esperar que nossa saúde mental vá por água abaixo. E é por isso que o tema “bem estar” tem sido usurpado pelo capitalismo, para gerar mais lucro. Como uma das formas de movimentar uma indústria lucrativa, os psicodélicos ganharam força para que pessoas possam experienciar um alívio do seu estado mental normal, se anestesiarem e não terem que lidar com sua própria realidade. 

Por a saúde mental ser um problema agudo, a alternativa que se chega são os estudos e pesquisas de alucinógenos para solucionar esse “problema”. Os psicodélicos vão movimentar investimentos da ordem de 7 bilhões de dólares nos próximos cinco anos. 

Diversos estudos têm sido realizados para explorar os benefícios de diversas substâncias, incluindo a Cannabis Sativa, que se mostra promissora como adjuvante no tratamento de epilepsia por meio de CBD (Canabidiol), sem substituir o uso de medicamentos tradicionais. Além disso, há evidências crescentes de que psicodélicos podem ser benéficos para o tratamento de outros transtornos. No entanto, a crescente indústria do uso de substâncias psicotrópicas tem o potencial de movimentar setores como moda, entretenimento e até mesmo a indústria da “cura”. É importante que os benefícios e riscos dessa substância sejam estudados cuidadosamente, levando em conta suas implicações em diversos aspectos da sociedade. 

Por isso, existem fortes indícios que apontam os alucinógenos tomarem o mesmo rumo do cannabis. Pode-se provar eficaz em alguns casos, mas podem também fazer muitas vítimas se não for olhada com atenção. Principalmente quando falamos da “indústria da cura”

Como o uso de psicodélicos pode ir no caminho contrário do autoconhecimento e saúde mental?

Hoje em dia, podemos observar a quantidade de pessoas que tem procurado grupos de apoio para usarem substâncias psicodélicas como forma de autoconhecimento. A busca pela “cura” tem se tornado cada vez mais nociva para vítimas de experiências de “rituais” de autoconhecimento. Esses eventos, geralmente, não possuem uma supervisão de um profissional da saúde qualificado para avaliar se aquele usuário está apto ou não a receber aquele tipo de tratamento. 

Em muitos casos, o auxilio que se dá a uma pessoa que quer fazer o uso de Ayuasca, por exemplo, é parar de tomar o medicamento que o paciente faz uso (como ansiolíticos ou antidepressivos, por exemplo). Muitas pessoas relatam que, quando tentaram parar, se sentiram piores e, ao seguir a sugestão do ritual e tomar a bebida sugerida, vivenciaram momentos de horror. Por pouco, saíram com vida. Outros, dizem que as pessoas no local dos rituais não estão preparadas para quando algo grave acontece com alguém. Isso é tratado como uma “limpeza espiritual” e não como um caso de emergência. Em alguns casos, alguns usuários chegam a óbito. 

Quando tentamos sair do nosso estado mental natural para se aventurar em uma outra realidade, acabamos ficando mais dependente daquela fantasia que vivenciamos. A realidade se torna cada vez mais insuportável de viver. 

O caminho do autoconhecimento deve ser sóbrio e identificar as raízes da causa de nossa angústia é o primeiro passo. Condições melhores de trabalho, políticas públicas efetivas e  investimento em uma educação que forme indivíduos com senso crítico, pode ser uma melhor opção do que amortecer uma sociedade inteira, alienando indivíduos de sua própria existência. Assim, fica muito mais fácil de sermos controlados, né?!


 

Como podemos falar desse tema de forma justa e verdadeira?

Começando por não prometer que pessoas com transtornos mentais e de ansiedade (que é a maioria da população mundial, atualmente) devem sair do seu estado de consciência. Essas promessas geram mais ansiedade e desespero pela “cura” imediata. O que acarreta em um mundo e uma sociedade cada vez mais alienada. Achando que o real problema está nela e não no sistema que ela está inserida. 

Falar abertamente sobre reais benefícios do psicodélicos através de pesquisas científicas, com evidências de melhora em alguns casos, pode ser um ponto forte. Implantar essa realidade de “psicodelia” em campanhas, ações para experiência do cliente no seu negócio pode ser um diferencial para a marca. Mostrar a cada indivíduo que as possibilidades são infinitas de experienciarmos esse conceito na moda, na comunicação e na medicina. Mas não como forma de dizer que isso será a cura para todo o nosso mal, sem um olhar atento ao consumo e ao consumidor. Responsabilidade, verdade e transparência devem ser incorporados aos negócios antes que seja tarde demais.